04/08/2013 – Justiça autorizou vasculhar lixo de empresas acusadas de cartel

G1
Mariana Oliveira

Autorização de busca também incluiu permissão para arrombar cofres.

Cade investiga suposto cartel em licitações do metrô de SP e do DF. 

A autorização da Justiça Federal de São Paulo para buscas nas empresas suspeitas de envolvimento em um suposto esquema de cartel em licitações do metrô de São Paulo e do Distrito Federal incluiu permissão para que servidores do Cade e oficiais de Justiça vasculhassem lixo e arrombassem portas e cofres.

A decisão da 4ª Vara Federal Cível da Justiça de São Paulo, disponível no site da Justiça Federal de São Paulo, confirma que a investigação começou após denúncia da empresa alemã Siemens, que firmou um acordo de leniência (equivale a uma delação premiada) com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão ligado ao Ministério da Justiça que avalia práticas anticoncorrenciais de empresas.

Nesta sexta (2), o jornal “Folha de S.Paulo” informou que a Siemens entregou documentos ao Cade nos quais afirma que o governo de São Paulo “deu aval” às irregularidades em licitações de obras. O Cade confirmou que foi firmado um acordo de leniência (equivale a uma delação premiada) sobre a suspeita, mas não informou se foi firmado com a Siemens. A Siemens negou ter sido a origem dos dados.

O pedido de busca e apreensão de documentos foi feito pelo Cade no dia 18 de junho, e concedido pela juíza Marcelle Carvalho um dia depois. A operação, denominada Linha Cruzada, foi realizada em parceria com a Polícia Federal nas cidades de São Paulo, Diadema, Hortolândia (SP) e Brasília (DF) no dia 4 de julho.

Ao autorizar buscas em dez empresas envolvidas no suposto esquema – Alstom, Parsons Brinckerhoff, Bombardier Transportation Brasil, Caf – Brasil, Tejofran, Iesa Projetos, Mitsui & CO, Serveng Civilssan, Temoinsa e Trans-sistemas de Transportes -, a juíza liberou apreensões inclusive em itens dos funcionários. Geralmente, a Justiça especifica o que pode ser apreendido para que o alvo da busca não questione a falta de autorização.

“Desde já se concede permissão para que os servidores do Cade e a força policial requisitada, necessária para garantir o cumprimento desta ordem acompanhem os oficiais de justiça designados, inclusive com o uso da força, se necessário, com arrombamento de portas externas e internas, gavetas, armários e cofres”, diz a decisão da juíza.

Em outro trecho, ela afirma que “fica autorizada a quebra dos dados magnéticos apreendidos; a apreensão de quaisquer objetos, livros, fitas, computadores e arquivos magnéticos, ou outro material que esteja em poder das requeridas ou de seus funcionários e corpo diretivo, inclusive em gavetas, cestos de lixo, cofres, etc”.

A juíza destaca que o acordo de leniência entre o Cade e a Siemens foi assinado no dia 22 de maio. A decisão afirma que, além da empresa, também assinaram o documento funcionários de empresas suspeitas.

“O referido acordo visou levar ao conhecimento do Cade a existência de cartel em licitações relativas a projetos de metrô e/ou trens e sistemas auxiliares no Brasil, no período compreendido entre, pelo menos, 1998 e 2008, de forma a auxiliá-la a empreender investigações sobre a conduta. Para tanto, os beneficiários confessaram suas participações, como co-autores, na conduta citada, com vistas a obter, em contrapartida, os benefícios [imunidade]”, diz o documento.

Projetos
Os dados indicam fraudes em pelo menos seis projetos “de extrema relevância”, segundo a Justiça de São Paulo: linhas 2 e 5 do Metrô de SP, manutenção e aquisição de 320 carros para a CPTM, programa Boa Viagem da CPTM e manutenção do Metrô do Distrito Federal.

Conforme a Justiça, os documentos apontam a prática de cartel. “As alegações do Cade são corroboradas pelos documentos acostados à inicial, os quais constituem indícios de que as rés envolveram-se na prática de cartel.”

Na linha 2 do Metrô de São Paulo, o Cade alega, segundo o documento da Justiça, “ter havido divisão de mercado e combinação de vencedor, com subcontratação dos demais”.

Na linha 5 do Metrô paulista, “há indícios de que as empresas inicialmente concorrentes decidiram formar um único consórcio após a fase de pré-qualificação, eliminando a possibilidade de disputa”.

Em relação à manutenção na CPTM, o Cade alegou, segundo a Justiça, “ter havido acerto prévio entre as empresas, sobre quais seriam vencedoras e quais seriam subcontratadas”. Na aquisição de carros, “teria havido a divisão prévia do objeto das licitações entre os concorrentes”.

No projeto Boa Viagem as suspeitas recaem sobre quatro licitações, para as quais as empresas teriam feito “tratativas”.

Por fim, a decisão aponta que, no Metrô do Distrito Federal, consórcios concorrentes “dividiriam o objeto da licitação, através da subcontratação do perdedor, sem prévia negociação de quem seria o vencedor”.

A juíza destaca que a busca e apreensão serviria para o Cade “colher provas suficientes para instauração de processo administrativo”.

Apuração em andamento

Nesta sexta, o Cade disse que as investigações estão em fase inicial e ainda não se sabe a “abrangência” do suposto cartel.

“Não é possível afirmar, no atual estágio de investigação, a abrangência do suposto cartel em licitações para aquisição de carros de trens, manutenção e construção de linhas de trens e metrôs no Brasil. O inquérito administrativo conduzido pela Superintendência-Geral do Cade é uma fase preliminar de investigação.”

Após a análise da documentação pela superintendência, o órgão vai decidir se instaura um processo administrativo para constatar a existência de cartel.

Se isso acontecer, será designado um relator para a investigação, que ouvirá a defesa das empresas e fará um parecer para ser submetido ao plenário do conselho, o tribunal do Cade, que decidirá se houve ou não a formação de cartel.

“Apenas após a análise de todo material apreendido pelo Cade durante a operação de busca e apreensão realizada no dia 4 de julho e eventual instauração de um processo administrativo é que poderão ser identificadas as empresas e pessoas físicas envolvidas, os projetos e cidades afetadas e o período em que o cartel teria atuado”, disse o Cade.

A assessoria do Cade informou que um processo de investigação de cartel demora, em média, de dois a três anos.

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