02/12/2014 – Haverá punição severa se cartel for provado, diz Cade
Folha de S. Paulo
Julianna Sofia
O presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), Vinicius Marques de Carvalho, afirma que, se comprovado o cartel nas licitações da Petrobras, as empresas envolvidas merecem ser “severamente” punidas.
As companhias podem ser proibidas de participar de licitações públicas por até cinco anos e impedidas de contratar empréstimos com bancos oficiais, explicou Carvalho em entrevista à Folha
A CGU (Controladoria-Geral da União) e o TCU (Tribunal de Contas da União) já acenaram com a possibilidade de acordos e repactuação de contratos para que as empresas continuem a contratar com o governo, evitando a paralisação de obras.
“Quando houve a crise financeira de 2008, apareceu o discurso too big to fail’ (grande demais para quebrar). Agora tenho a impressão que aparece um discurso do too big to be punished’, ou seja, grande demais para ser punido”, diz Carvalho. Cartel, completa, é uma prática “muito lesiva” à população.
“Os cartéis em licitação são ainda mais lesivos ao Estado, extraem renda da população e merecem ser severamente punidos. Se criarmos um ambiente em que grandes empresas não necessariamente seriam punidas porque teria um impacto X na economia, seria um incentivo para manter essas condutas. Aqui do Cade, esse incentivo certamente não virá”, declara.
“O órgão de defesa da concorrência quando investiga cartéis precisa usar todo o rigor da lei para dar punições exemplares. Mas qualquer punição sempre deve levar em conta a necessidade de preservar a atividade econômica em questão para não inviabilizar um setor da economia.” E cita outras penalidades em caso de condenação.
Entre elas, multa equivalente a 20% do faturamento. Em tese, isso poderia levar a um valor recorde na história de combate a cartéis no país, considerando o porte das nove companhias citadas no esquema. A maior multa já aplicada foi ao cartel do cimento, superior a R$ 3 bilhões.
LENIÊNCIA
Via autorização judicial, o Cade teve acesso às investigações da Operação Lava Jato pouco depois de uma das empresas citadas, o grupo Setal, procurar as autoridades de defesa da concorrência para fazer um acordo de leniência.
Nesse tipo de acordo, quem delata o cartel pode ser beneficiada com imunidade administrativa e criminal. Só a primeira firma a entregar o conluio recebe esse “perdão”.
Para os demais, ou há punição, no caso de condenação; ou resta um acordo do tipo TCC (Termo de Cessação de Conduta), em que a empresa precisa colaborar com a investigação, assumir os erros e garantir a suspensão do cartel. Também é exigido o pagamento de uma contribuição.
Segundo Carvalho, é “muito comum” a existência de cartéis em licitações no país.
Questionado se a afirmação não endossaria a polêmica declaração do advogado do empresário investigado Fernando Soares (“Se não fizer acerto [com políticos], não coloca um paralelepípedo no chão”), ele argumenta: “De cada dez processos que o Cade abre relacionados a possíveis cartéis em licitações, há condenação em nove. Acho que posso dizer que é comum esse tipo de conduta, sim”.
O Cade também analisa, com base nas informações que recebeu da Operação Lava Jato, se as mesmas empresas acusadas de cartel na Petrobras atuariam em outras áreas, como energia.
“A Superintendência-Geral do Cade está analisando isso. Existem algumas investigações sobre o setor elétrico aqui no Cade envolvendo supostos cartéis em licitações. De posse do material que foi compartilhado da operação, vamos analisar se há uma coincidência com as investigações que já estávamos fazendo”, disse.
Neste ano, já houve 34 condenações de empresas por práticas contra a concorrência. No ano passado, foram 22. Em 2012, foram duas. Já os TCCs somaram 23 e levaram a uma arrecadação de R$ 117 milhões. Em 18 deles, a investigação era relativa a cartel.
QUEM INVESTIGA A LAVA JATO
Esquema de corrupção na Petrobras está na mira de vários órgãos
CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA Investiga a prática de cartel e pode aplicar multas pesadas às empresas. O grupo Setal negocia um acordo para obter imunidade
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Apura as suspeitas de envolvimento no caso de políticos com foro privilegiado. O ministro Teori Zavascki é o relator das ações que tramitam no Supremo
JUSTIÇA FEDERAL Tendo à frente das investigações o juiz Sergio Moro, apura possíveis crimes envolvendo pessoas sem foro privilegiado, como empresários e ex-funcionários da Petrobras
CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO Segundo o ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, as empreiteiras que forem condenadas terão de ressarcir a Petrobras, renegociar contratos e cola-borar com as investigações
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO O presidente do TCU, ministro Augusto Nardes, afirmou que os desvios na estatal apurados pelo órgão já passam dos R$ 3 bilhões.