04/11/2013 – Emenda sob investigação
Correio Braziliense
Saulo Araujo
A Polícia Civil apura supostas falhas na execução de verba destinada pelo distrital Wellington Luiz ao projeto Paz no Teatro, voltado para escolas públicas no Varjão. Os R$ 100 mil não chegaram a ser aplicados em nenhuma atividade proposta
Uma emenda do deputado distrital Wellington Luiz (PMDB) é alvo de investigação da Delegacia Especial de Repressão aos Crimes contra a Administração Pública (Decap), da Polícia Civil do DF. Em outubro do ano passado, o parlamentar autorizou a liberação de R$ 100 mil para a execução de um projeto chamado Paz no Teatro, no Varjão. O valor foi depositado na conta do Instituto Nacional de Excelência em Políticas Públicas de (Inepp), contratado para gerenciar o programa, mas nenhuma atividade chegou a ser desenvolvida na cidade.
Pelo escopo da proposta, grupos teatrais deveriam visitar, em dias diferentes, diversas escolas públicas no Distrito Federal alertando os alunos sobre os riscos do uso de drogas e álcool. Porém, os R$ 100 mil foram empenhados para a montagem de uma tenda de plástico em uma praça vazia. Além disso, nenhum artista apareceu. Três dias antes da realização do Paz no Teatro, o então administrador do Varjão, Hélio das Chagas, foi exonerado do cargo. Em seu lugar, assumiu José Ricardo do Nascimento, que, ao avaliar os documentos, não autorizou o evento.
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Mesmo assim, a tenda foi instalada. “Era uma época de transição e mandei suspender tudo o que estava em curso. Ainda assim, acabei surpreendido com a tentativa de algumas pessoas em realizar o evento de qualquer jeito. Mandei recolher tudo e enviei o processo para a Secretaria de Transparência”, contou José Ricardo.
O Correio visitou o local onde deveriam ocorrer as apresentações artísticas. Uma moradora, que preferiu não se identificar, pensou se tratar de uma iniciativa de alguma empresa. “Como não houve divulgação para a comunidade, achei que era promoção de algum produto. Não dá para acreditar que gastaram R$ 100 mil com isso”, disse.
Um comerciante da região também estranhou. “Qualquer leigo saberia que tudo estava sendo feito nas coxas. O que mais me surpreende é terem cobrado esse valor absurdo para montar uma tenda de plástico, de material bem vagabundo”, reclamou.
Para o delegado-chefe da Decap, Vicente Paranaíba, existem diversas falhas no empenho da emenda. Resta saber se os erros foram propositais. “Verificamos que houve inobservância das legalidades na hora da contratação da empresa. Era necessário ter um projeto que justificasse a contratação direta, com dispensa de licitação. Queremos saber se houve dolo e investigar por que o projeto não foi executado como acordado em contrato”, destacou.
Após o recebimento da denúncia, a Decap cumpriu um mandado de busca e apreensão na casa da ex-diretora-geral da Administração do Varjão. Ela seria a responsável por fazer o empenho da emenda de Wellington Luiz. Na residência de Áurea Francisca Rodrigues de Moraes, agentes da unidade especial da Polícia Civil recolheram computadores e documentos. Ela não foi encontrada pela reportagem.
Desvirtuamento
O deputado Wellington Luiz admitiu que houve falhas graves na execução da emenda, mas alegou que não sabia do desvirtuamento da proposta. Ressaltou ainda que a polícia só iniciou a apuração do caso provocada por ele. “Quando eu percebi os absurdos que fizeram com a emenda, tratei, como um cidadão comum, de fazer a denúncia na 9ª Delegacia de Polícia (Lago Norte). Eu fui o mais surpreendido. Por livre espontânea vontade, fui o primeiro a depor, pois entendo que há indício de crime contra a administração pública, e isso precisa ser investigado com o mais absoluto rigor”, afirmou.
Segundo Wellington, Áurea foi a responsável pelo suposto desvio de finalidade da emenda. “Ela estava na administração por indicação minha, mas quebrou a minha confiança. Áurea era a responsável por esses contratos, pelas emendas. Quero acreditar que ela cometeu um grande equívoco, e não tenha agido de má-fé”, disse.
Com relação a Hélio das Chagas ter autorizado a execução do projeto, o parlamentar justificou. “Quem respondia pelas emendas era a Áurea. Ela conduzia tecnicamente os processos. O administrador acompanha o entendimento”, disse o distrital. Procurado, Hélio, que também foi indicado por Wellington, admitiu ter autorizado a execução da emenda, mas não se pronunciou por “não se lembrar dos detalhes”.
A reportagem também entrou em contato com o secretário de Cultura da administração à época, Daniel Brandão, mas ele disse não ter conhecimento da denúncia e negou que o projeto tenha passado pelo seu crivo. Pelo teor do programa, o departamento que ele chefiava deveria estar ciente dos detalhes. Nenhum representante do Inepp foi localizado pelo Correio.
Colega cassado
Na última quarta-feira, o deputado Raad Massouh (PPL) foi cassado por 18 dos 24 parlamentares após votação na Câmara Legislativa. Massouh é acusado de desviar R$ 100 mil de uma emenda liberada por ele em 2010 para um evento rural em Sobradinho. O valor é o mesmo do inquérito policial nº 50, que corre na Decap e envolve o nome do deputado Wellington Luiz. O político do PMDB não revelou como votou no processo de cassação do mandato do colega Raad.