05/11/2017 – Delator diz que sua agência manipulava licitações do governo do Rio
O Globo
Thiago Herdy
Segundo Renato Pereira, contratos de publicidade foram direcionados para a Prole ou empresas sugeridas por ela
BRASÍLIA — Os contratos de publicidade do governo estadual do Rio de Janeiro dos últimos dez anos foram direcionados para a Prole ou empresas sugeridas por ela, de acordo com relato do marqueteiro Renato Pereira em seu acordo de colaboração premiada, cujo conteúdo foi revelado pelo GLOBO neste domingo. Sócios da Prole participaram até mesmo da redação de pareceres e justificativas para notas baixas de concorrentes, com o intuito de controlar as licitações. Segundo o delator, um irmão do governador Sérgio Cabral, o publicitário Maurício Cabral, tinha participação nos lucros obtidos com os contratos.
A participação de Maurício foi decidida, segundo ele, durante um café da manhã no Copacabana Palace, em 2007. O irmão do governador é descrito por Pereira como um “publicitário bastante conhecido no mercado” e figura de seu relacionamento e de seus sócios. As cinco agências vencedoras da licitação de publicidade daquele ano foram previamente escolhidas pelo próprio Sérgio Cabral, de acordo com Renato Pereira.
O delator diz ter sido procurado em 2007 por Ricardo Luiz Rocha Cota, então subsecretário de Comunicação do governo, para que ajudasse na organização de todo o procedimento licitatório, a ser feito no ano seguinte. Pereira designou ao então sócio de criação publicitária da agência, Flávio Horácio Peixoto Azevedo, a função de redigir pareceres e avaliação de propostas apresentadas. Além de Cota, participaram da fraude Regis Fichtner, subsecretário de Casa Civil, e Wilson Carlos, secretário de governo, além de Maurício Cabral, segundo o relato.
Para não correr o risco de ser descartada da licitação, em função de sua estrutura modesta, a Prole participou do processo por meio do grupo Profissionais da Propaganda Reunidos (PPR), ao qual estava vinculada e que ficou entre os cinco vencedores. A empresa de Pereira voltaria a estar entre as escolhidas nas duas licitações seguintes do governo do estado, feitas em 2010 e 2016.
Segundo dados oficiais da Secretaria de Fazenda do Rio de Janeiro, desde 2008, PPR e Prole faturaram R$ 229,6 milhões com a publicidade do estado, em contratos decorrentes, de acordo com o relato do delator, das licitações fraudulentas.
Antes mesmo da primeira disputa oficial pela conta, os sócios da Prole já abocanhavam sua parte na publicidade estatal, segundo Pereira. Em 2007, a produtora Carioca Filmes era subcontratada pela então detentora do contrato com o estado, a empresa Eurofort, para registrar vídeos de ações do governo. O favorecimento ocorria com o aval de Wilson Carlos e de Luiz Cota, então subsecretário de comunicação. De acordo com o delator, 90% dos lucros da Carioca Filmes ficavam com a Prole.
Nos anos seguintes, quando a Prole indicava uma agência para prestar serviços ao governo do Rio, recebia um percentual do contrato. Foi o que ocorreu em 2012, segundo Pereira, quando a Agência 3 foi escolhida em licitação para atender a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae).
Segundo o delator, um terço dos lucros desse contrato eram repassados à Prole e outro terço a Maurício Cabral. A Cedae informou que o contrato com a Agência 3 vigorou entre 2013 e 2016 e teve custo de aproximadamente R$ 50 milhões.
Em nota, a Agência 3 negou “as alegações da suposta delação”. Registrou ter vencido licitação “de forma lícita” e prestado serviços “de forma proba, transparente e de acordo com a lei”. A Cedae lembrou que a licitação foi aprovada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE). “Não houve solicitação de recurso por parte dos outros participantes”. Ambas dizem estar à disposição para prestar esclarecimentos.
Diretor da Eurofort, Cláudio Barreto afirmou desconhecer as alegações de Renato Pereira e disse que sua empresa trabalha há 15 anos “pautada na ética e de acordo com os termos e condições estabelecidos em contratos”. Ricardo Cota e Flávio Azevedo não quiseram se manifestar. Sócios da Carioca Filmes e Regis Fichtner não foram localizados.