05/12/2014 – O clube das tenebrosas transações
O Povo
Fábio Campos
Uma informação publicada ontem no portal do O Estado de S.Paulo oferece um retrato estarrecedor das relações público-privadas no Brasil. Vejam: “Para ratear as obras da Petrobras, o cartel de empreiteiras investigado na Operação Lava Jato elaborou um regulamento semelhante às normas de um ‘campeonato de futebol’. A revelação foi feita pelo executivo Augusto Ribeiro de Mendonça, da Toyo Setal, em depoimento à Polícia Federal”.
O executivo em questão está abrigado sob as rígidas regras da colaboração premiada. Ou seja, mentir é um péssimo negócio para o depoente. Segundo Mendonça, “as normas do ‘clube’ de empreiteiras chegaram a ser escritas e eram de conhecimento das empresas participantes. Porém, os registros foram destruídos após a Operação Lava Jato ser deflagrada, em março, devido ao risco de ser apreendidos e usados como prova pelos investigadores”.
O termo “clube” já foi usado várias vezes em meus tempos de coluna política nos comentários acerca do conjunto de empreiteiras que dividem entre si as grandes obras públicas no Brasil. Incluam-se aí as grandes obras estaduais que são financiadas em boa parte pelo Governo Federal. É um clube fechado. Não se fura esse bloqueio, a não ser que o clube assim deseje.
Vejam esse ponto do depoimento: “Em algum momento, alguém escreveu essas regras, como se fossem (de) um campeonato de futebol, para evitar discussões entre as empresas do clube”.
O depoente relatou que as empreiteiras se reuniam regularmente para escolher com qual obra da Petrobras cada uma ficaria. “As empresas davam notas para os projetos, de 1 a 3, conforme suas prioridades. A partir daí, discutiam os preços a ser apresentados nas licitações. As vencedoras eram previamente definidas. As demais participantes das concorrências entravam como figurantes”.
Pois é. Alguma surpresa? Nenhuma. Já se sabia que a coisa toda funciona assim há muitos anos. A novidade agora é o relato de um personagem membro do clubinho das tenebrosas transações. É evidente que o outro lado dessa história absurda é o setor público, que faz as licitações e é gerido pela política, que cobra a sua parte no bolo de lama.
Neste mesmo depoimento, Mendonça contou que parte do pagamento de propina ao ex-diretor de Serviços da Petrobras, Renato Duque, era direcionada ao PT como doação oficial ao partido. Bom, essa delicadíssima parte da conversa fica para outra análise.
Sempre nos bastidores e de maneira informal, já ouvi vários relatos de como o clube age para garantir as regras do “campeonato”. Sim, uma vez ou outra, novas empresas conseguem ganhar o direito de participar da disputa e até vencer. Mas é como se fosse uma, digamos, generosa concessão.
Atentem que isso costuma ocorrer no âmbito das obras estaduais (com financiamento federal). Empresas de médio porte acabam ganhando licitações, mas quase sempre em parceria com uma empreiteira gigante sócia do “clube”. Ocorre assim, geralmente, por pressão da força política que está no poder local.
Muitas vezes, essas empresas médias são convidadas a compor consórcios por serem íntimas das circunstâncias locais. Exemplo: bom trânsito junto ao poder estadual ou municipal (no caso das grandes cidades) e facilidade de se movimentar junto ao Judiciário.
Com as delações premiadas, o País está ganhando a chance de conhecer a fundo os esquemas de corrupção. É a oportunidade da mudança. Que ela venha.