11/04/2017 – PF prende ex-secretário de Cabral por suspeita de fraude em licitação e corrupção
G1 Rio
Alba Valéria Mendonça e Fernanda Rouvenat,
Agentes prenderam Sérgio Côrtes e mais 2 empresários em desdobramento da Lava Jato que apura fraude em licitações e pagamento de propina ao ex-governador. Desvio chega a R$ 300 milhões.
Agentes da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da Receita Federal prenderam, na manhã desta terça-feira (11), Sérgio Côrtes, ex-secretário de Saúde do governo Sérgio Cabral, e os empresários Miguel Iskin e Gustavo Estellita.
A operação, que é mais um desdobramento da Lava Jato no Rio, foi batizada de “Fatura Exposta” e cumpre também três mandados de condução coercitiva, contra Sérgio Eduardo Vianna Junior, Marco Antônio Guimarães Duarte de Almeida e Rodrigo Abdon Guimarães, e mandados de busca e apreensão em diversas empresas suspeitas de ligação com o esquema.
As prisões foram pedidas a partir da delação premiada de César Romero, que trabalhou com o ex-diretor do Into, ex-secretário executivo de Côrtes na Saúde, e foi o resposável por entregar todo o esquema. A delação foi homologada pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal.
A operação investiga fraudes em licitações para o fornecimento de próteses para o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into). Os investigadores afirmam que, entre 2006 e 2017, os desvios chegaram a R$ 300 milhões, segundo informações do RJTV.
De acordo com as investigações, quando era diretor do Into, Sérgio Côrtes teria favorecido a empresa Oscar Iskin, da qual Miguel é sócio, nas licitações do órgão. Gustavo Estellita é sócio de Miguel em outras empresas e já foi gerente comercial da Oscar Iskin. A empresa é uma das maiores fornecedoras de próteses do Rio.
A operação também apura desvios na Secretaria de Estado de Saúde, com o pagamento de propina para a organização criminosa comandada pelo ex-governador Sérgio Cabral. O esquema também envolveria pregões internacionais, com cobrança de propina de 10% nos contratos, nacionais e internacionais.
Desse percentual, segundo a investigação, 5% caberia a Cabral, 2% a Sérgio Côrtes, 1% para o delator Cesar Romero, 1% para o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e 1% para sustentar o esquema. Ainda segundo a investigação, Iskin pagava uma mesada de R$ 450 mil para a organizacao criminosa do ex-governador.
Além do superfaturamento nos contratos, que possibilitava o pagamento de propina de 10%, os acusados também desviavam recursos e mandavam o dinheiro para o exterior.
“No pregão internacional, a empresa estrangeira é obrigada a cobrir todos os gastos que teria uma empresa nacional com isso, inclusive dos impostos. No caso, o Into e a secretaria estadual de saúde, que são imunes a esses tributos. Então, era levado um preço, de 1 milhão por exemplo. Com os impostos, seriam 600 mil, com 40% de desconto. Mas ao invés de pagar esse valor, era pago R$ 1 milhão”, explicou Cleber Homem de Oliveira, auditor da Receita Federal. A declaração de importação era pelo preço total, sem os descontos previstos, e uma parte desse dinheiro era desviada para o esquema de corrupção.
Fazendo esses cálculos a partir valor das importações do Into e da Secretaria Estadual de Saúde, de 2007 a 2016, e as contratações e vendas que a Receita conseguiu identificar, estima-se que o valor desviados chegou a cerca de R$ 300 milhões. Os presos serão indiciados por corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
A Oscar Iskin informou, em nota, que ainda não teve acesso aos autos da investigação promovida pelo Ministério Público Federal, mas negou o envolvimento em práticas ilícitas. “No decorrer das investigações ficará comprovado que nenhuma irregularidade foi cometida pelo seu sócio-controlador ou por qualquer outro representante da empresa. Com reputação construída ao longo de mais de sete décadas, a Oscar Iskin seguirá à disposição das autoridades para prestar todas as informações necessárias ao esclarecimento dos fatos.”, diz a nota.
Sérgio Côrtes deixou o prédio onde mora na Rua Borges de Medeiros, na Lagoa, às 9h25, e foi levado pelos agentes da Polícia Federal para a sede do órgão, no Centro do Rio.
O empresário Gustavo Estellita, que mora na mesma rua, foi preso por volta das 7h50, e tentou esconder o rosto. Pessoas que passavam pelo local no momento o chamaram de “ladrão”.
Segundo dados do Portal da Transparência da União e do Estado do Rio de Janeiro, entre 2007 e 2017, duas das empresas investigadas, a Oscar Iskin (de Iskin) e a e Cia Ltda e Levfort Comércio e Tecnologia Médica Ltda, obtiveram em contratos relacionados à área da saúde de quase R$ 369 milhões.
“Considerando as declarações do colaborador, que afirmou que ao menos 10% desses valores era desviados ao abastecimento da organização criminosa, poder-se-ia estimar que somente através dessas duas empresas teria havido o desvio de aproximadamente R$ 36.895.837,82 dos cofres públicos”, escreveu o juiz Marcelo Bretas em sua decisão.
Gustavo Estellita é conduzido por agentes da PF
Outro delator dessa fase é Vivaldo Filho, funcionário de Renato Chebar, que era operador do mercado financeiro que atuava em nome de Sérgio Cabral para enviar valores ao exterior. Ele disse que ia com o Carlos Miranda (ex-assessor de Cabral) pegar e receber propina do esquema de Cabral no endereço da Oscar Iskin.
Na decisão que determina a prisão de Côrtes, o juiz Marcelo Bretas afirma que o ex-secretário tentou “embaraçar as investigações”, fazendo com que o delator César Romero, ex-subsecretário da pasta, não celebrasse o acordo de colaboração premiada ou que combinasse o que seria dito.
Uma conversa entre os dois, no escritório de Romero, foi gravada. Nos diálogos, Côrtes deixa claro que é necessário entrarem em acordo sobre o que será dito: “Peraí, César… você já estava fazendo, aí foi quando eu falei pro [Sérgio Vianna] Júnior. ‘Júnior, o ideal é que pelo menos a gente tenha alguma coisa parecida… porque se ele falar de A,B,C,D e eu falar de C, D, F, G, f****, porque A e B eu não falei e F e G ele não falou’.”.
Côrtes teria ido ao escritório do ex-subsecretário, como atestam imagens recolhidas pelo Ministério Público Federal (MPF) e chegou a se oferecer a pagar os advogados de Romero através de Sérgio Vianna Junior, que é cunhado de Côrtes e primo de Romero.
Côrtes entrou como médico no Into em 1990 e de 2002 até 2006 foi diretor do órgão. Em 2007 ele passou a atuar como secretário de Saúde na gestão de Sérgio Cabral, onde permaneceu até 2013.
De acordo com o Ministério Público Federal, no desenrolar das investigações no âmbito das Operações Calicute e Eficiência, foi possível desbaratar a gigantesca organização criminosa responsável por mais desvios milionários dos cofres públicos dinheiro público do estado, cuja liderança é atribuída ao ex-governador Sérgio Cabral.
Notificado pelo TCE
Côrtes esteve ao lado do ex-governador Sérgio Cabral durante toda a sua gestão. Ele aparece na polêmica sequência de imagens em Paris do ex-governador e amigos num restaurante com guardanapos na cabeça.
Em 2015, a CPI da Máfia das Próteses na Câmara pediu que MP e PF aprofundassem investigações sobre a Oscar Iskin.
Em dezembro do ano passado, o Plenário do Tribunal de Contas do Estado (TCE) determinou a notificação do ex-secretário Sergio Côrtes. Segundo o órgão, durante sua gestão, pelo menos oito cooperativas foram contratadas pela secretaria com dispensa de licitação e sem comprovação efetiva de prestação de serviços. O valor do prejuízo, estimado pelo corpo técnico do TCE, é de R$ 600 milhões.