19/09/2011 – Gato por lebre
O Globo
Jorge Darze
TEMA EM DISCUSSÃO: Contratação de Organizações Sociais para gerenciar a Saúde
A Alerj aprovou projeto de lei que instituiu as organizações sociais no sistema estadual de saúde pública, entregando a elas a gestão das unidades de atendimento. Tentaram e continuam tentando apresentar à opinião pública uma pílula dourada, que supostamente teria condições de resolver o caos existente no setor. Explicam que os sintomas dessa patologia estão expressos no pesado fardo de regras e legislações que a administração pública carrega, incluindo os servidores com o direito a estabilidade, e defendem a gestão privada para garantir a boa assistência à população.
Rotulam a todos nós, opositores desse projeto, como integrantes de “castas” que se “locupletam” com o atendimento precário aos pacientes. Esquecem-se de que ao longo dos últimos anos essa administração tem sido ineficiente e promovido uma mortalidade elevada. Portanto, se temos que identificar os responsáveis, logicamente são os atuais gestores, lembrando que a responsabilidade pela escolha desses administradores é sempre do chefe maior, o Poder Executivo.
O constituinte incluiu a obrigatoriedade do concurso público para os servidores na Carta Magna, atendendo aos reclamos da população, e assim a protegeu, garantindo a qualidade da prestação dos serviços através de profissionais competentes. Já com a estabilidade, o servidor tem imunidade para denunciar o que contraria o interesse público, inclusive o gestor incompetente ou que desvia recursos do Erário. No caso da mão de obra terceirizada, o mau gestor pode demitir quem ouse questionar a sua administração. Portanto, estamos falando de regras constitucionais que têm como objetivo a defesa da população. A administração pública tem muitas referências de eficiência. Na Saúde, por exemplo, temos o Inca, o Into, o Instituto Nacional de Cardiologia e o Hemorio, entre outros. A Constituição Federal estabelece a saúde como direito do cidadão e dever do Estado, e essa obrigação não pode ser delegada a terceiros. O privado só existe como complemento daquilo que o sistema não disponibiliza no momento, o que difere do caso em discussão.
Os exemplos de OSs existentes no país denunciam maior custeio, desvio de verbas públicas, equipes incompletas de profissionais etc. Desde 2009, o sistema está implantado na rede municipal do Rio, com uma baixa eficácia e graves ilegalidades. Recente inspeção feita nessas OSs pelo Tribunal de Contas revelou várias distorções no uso do dinheiro público, demonstrando a má fiscalização da Secretaria municipal de Saúde, visto que foi no seu relatório que o TCM encontrou tais irregularidades.
Essas organizações foram escolhidas sem licitação e sem a verificação da sua competência. O projeto estadual repete os mesmos vícios, daí imaginarmos o que nos espera. Na verdade, a origem dessa proposta está na Lei 9.637/98, de concepção neoliberal, que molda e acelera o projeto de entrega do que é público ao privado, reduzindo o papel do Estado na economia e nas funções sociais. Essa lei teve a sua constitucionalidade arguida no STF pelos mesmos partidos que, hoje, curiosamente a defendem. Na verdade, a pílula dourada não passa de um placebo. Não podemos deixar que o governo do estado venda gato por lebre à nossa população.