21/01/2013 – Licitações que favorecem indústria nacional demoram a deslanchar
O Estado de S. Paulo
Iuri Dantas
Governo gastou apenas 20% da meta de R$ 15 bilhões em compras públicas com margens de preferência para produtos brasileiros
A intenção da presidente Dilma Rousseff de usar as compras públicas para estimular a indústria nacional começou em marcha lenta. O governo gastou menos de 20% da meta de R$ 15 bilhões em licitações com margem de preferência, quando a administração pública fica autorizada apagar preços maiores, desde que os produtos sejam fabricados no País. De outro lado, foram gastos R$ 2,5 bilhões em aquisições que, sem a margem, poderiam ir para o exterior. Os resultados dividem a opinião de técnicos do governo e empresários ouvidos pelo Estado. Parte da equipe de Dilma lamenta que a política ainda não tenha representado saltos tecnológicos. Isso porque o regime de margens de preferência tem dois objetivos: assegurar demanda para a indústria e estimular a fabricação de produtos de alta tecnologia que ainda não saem de fábricas nacionais. Em 2012, por causa da crise, só a primeira parte saiu do papel. Entre empresários, há elogios sobre a postura, mas também críticas sobre a timidez dos gastos federais no ano passado. O único consenso entre setor privado e público é a expectativa de que a política faça diferença para valer neste ano, com a inclusão de novos setores e ampliação do volume de compras.
Licitação.
A política de margens de preferência começou a sair do papel em 2011, quando Dilma regulamentou a ideia lançada em lei por Lula no ano anterior. A presidente vendeu a ideia como uma estratégia de avanço tecnológico e uso do poder de compra do Estado para desenvolver e ajudar a indústria nacional a competir com importados. A política inverte a lógica da Lei de Licitações, de 1993. Permite ao governo federal gastar até 25% a mais para comprar um produto, se for fabricado no Brasil. Ao todo, há hoje nove decretos com margens para produtos específicos. Assim, qualquer órgão federal, seja universidade ou quartel das Forças Armadas, fica obrigado a cumprir a norma em leilões ou pregões eletrônicos. A regra vale apenas para a União. A adesão de Estados e municípios é voluntária, o que diminui a efetividade do programa. Não foi fácil implementar a mudança. Em 2011, o governo testou uma margem de 10% na compra de retroescavadeiras e de 18% para motoniveladoras. Foi escolhida uma licitação pequena, da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf). A disputa foi vencida por fabricantes chineses e a margem foi elevada para 15% e 25%, respectivamente. Os técnicos não conseguiram estender a política para um grande número de setores. Antes de ser publicado, cada decreto exige de três a seis meses de estudos. A Universidade de São Paulo (USP) e a Fundação Getúlio Vargas (FGV) colaboram com pesquisas específicas.
Vetos.
Para ganhar a margem nas compras do governo, a indústria precisa ter um custo significativamente maior que os concorrentes estrangeiros, entre outros aspectos, como o número de produtos que fabrica no País. Por causa disso, os técnicos concluíram que não há base para beneficiar fabricantes de motocicletas e automóveis. Há, também, boas notícias. Os empresários brasileiros disputaram tanto as licitações em que houve aplicação de margem de preferência que os preços acabaram ficando abaixo do previsto e a medida não foi necessária. Foi o caso de fardas do Exército. Ao elaborar as margens, o grupo de trabalho coordenado pelo Ministério da Fazenda enfrentou alguns dilemas. Afinal, se o governo aceita um preço maior para privilegiar a indústria nacional, teria de prever mais dinheiro para a licitação, já que a quantidade de itens comprados com determinada quantidade de recursos seria menor. Na prática, porém, esse problema foi evitado pela competição . Outro problema diz respeito aos critérios que dizem se determinado produto é nacional ou importado (geralmente uma porcentagem de peças que pode vir de fora). Foi o que aconteceu em relação a trens e papel que é transformado em dinheiro. Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o primeiro ano de funcionamento pleno do sistema não permite uma avaliação “robusta”. Mas a entidade vê a estratégia de forma positiva. “Esperamos e desejamos encomendas de conteúdo tecnológico”, disse Paulo Alem Filho, gerente executivo de Política Industrial da CNI. “É isso que pode mudar o nível da indústria, gerar produção de tecnologia de ponta.”
PARA LEMBRAR
Programa faz parte do PAC
No fim de junho, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, lançou o “PAC Equipamentos – Compras Governamentais”, em solenidade com a presença de Dilma. Um dos objetivos era estimular a economia, o que não ocorreu. Os analistas estimam que o PIB cresceu 1% em 2012