25/08/2013 – Empresa criada há quatro meses ganha licitação de marmitex
Cruzeiro do Sul
Míriam Bonora
A nova empresa funciona em restaurante do irmão do vice-prefeito
A nova empresa que vai fornecer refeições tipo marmitex pelos próximos seis meses aos servidores da Prefeitura de Votorantim funciona nos fundos do restaurante Assadão, que pertence a Milton Ribeiro Mendes, irmão do vice-prefeito Silvano Donizetti Mendes. A Votoserv Refeições Eireli, que venceu a licitação, foi criada em abril deste ano e o proprietário é Welton da Silva Dantas, auxiliar de cozinha no Assadão, que é casado com a irmã de Sueli, a esposa de Milton.
A contratação da nova empresa ocorreu em pregão presencial no último 13 de agosto, em meio a diversas reclamações de funcionários da prefeitura, que criticam a má qualidade da refeição servida há anos por outras empresas. Nesse dia, ao invés de Dantas, quem representou a Votoserv foi Milton (dono do Assadão e irmão do vice-prefeito) como procurador da empresa. O resultado da licitação foi publicado anteontem no jornal oficial Município de Votorantim.
Segundo informações das fichas cadastrais disponibilizadas pela Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp), a Votoserv possui capital social de R$ 80 mil, endereço na rua Julia Martins Domingues 1.094, e tendo Welton da Silva Dantas como único sócio e proprietário. Já o Restaurante Assadão Jd. Clarice tem capital social de R$ 20 mil e como sócios Milton Ribeiro Mendes, irmão do vice-prefeito, e Tharles Mendes.
A reportagem esteve no endereço da Votoserv e percebeu que o imóvel integra e é interligado fisicamente ao Assadão, que fica logo na via de cima, a avenida Gisele Constantino, 30. Questionado sobre o assunto por telefone, Dantas confirmou que trabalha como auxiliar de cozinha no Assadão e diz que alugou uma cozinha do restaurante para produzir as marmitas. Ele afirmou que esse espaço já é usado pelo Assadão, que possui um restaurante e também faz entregas de marmitex, mas que ele utilizará em outro horário.
A prefeitura já tinha tentado contratar uma empresa em 12 de junho, data do primeiro pregão (em concorrência por outro edital, que previa contrato por 12 meses), mas a licitação foi cancelada pois nenhuma inscrita apresentou todos os documentos exigidos naquela data, incluindo a mesma Votoserv. Esse primeiro edital de licitação foi assinado pelo prefeito em 29 de maio de 2013, conforme consta no documento.
O proprietário da Votoserv afirmou que desde a criação da empresa, em 30 de abril de 2013, ainda não fornecia refeições para nenhuma empresa ou pessoas físicas, e que começaria a produção hoje, quando começou a valer o contrato com a prefeitura de Votorantim. “A empresa é nova. Eu aluguei uma cozinha do restaurante [Assadão] para fornecer marmita para a prefeitura de Votorantim”, informa Welton Dantas. Ele afirma que, após ganhar a licitação, em 13 de agosto, passou a providenciar a contratação de funcionários para trabalhar na produção e entrega das refeições.
Sobre o valor do contrato, o proprietário da Votoserv declarou que seria “um valor muito baixo”, que ele terá que se “esforçar muito”, que “terá muito trabalho” e que vai conseguir fornecer comida de qualidade e pagar as contas da empresa. Porém, ao ser perguntado que valor baixo seria esse, Dantas sugeriu que a conversa fosse pessoalmente e até marcou um horário para que a reportagem fosse até o Assadão e conversasse também com Milton. Porém, alguns minutos depois, Dantas ligou e disse que não seria possível receber a equipe e que deveria ser feito contato com seu advogado, Mário Rogério Dias.
Em contato com Dias, foi informado que o preço unitário oferecido pela Votoserv na licitação, modalidade menor preço, foi de R$ 6,73 por refeição. De acordo com padrão do edital, esse valor seria de R$ 103.911,20 mensais, totalizando R$ 623.467,20 por seis meses. O valor é bem abaixo do estimado pela prefeitura no edital, que seria de R$ 9,60 por refeição e um total de R$ 889.344,00.
Contradições
Sobre a ligação familiar com Milton, Dantas primeiramente confirmou que é cunhado do irmão do vice-prefeito, mas após ser procurado pela reportagem se identificou ao telefone, ele negou por várias vezes que tenha qualquer relação de parentesco com a família do proprietário do Assadão. A reportagem procurou por Milton em seu restaurante por diversas vezes na tarde de anteontem, deixou recado, mas a informação era de que ele não estava e que não poderiam fornecer outro telefone. Também não houve retorno da ligação até o fechamento desta edição.
Welton Dantas atendeu a reportagem pelo telefone fixo do Assadão, confirmou que trabalha no restaurante e tem em sua página no Facebook a descrição de trabalho como “ausiliar de cozinha” (sic) na empresa. Entretanto, depois de contatar seu advogado, Dantas negou que trabalhe no local. “Eu conversei com ele e não tem nada a ver, ele disse que nunca prestou serviço para o seu Milton [dono do Assadão]”, contou o advogado Márcio Dias.
Por meio do advogado, Dantas também afirmou que já prestou serviços para outras empresas “nesse intervalo de tempo”, ou seja, de abril para cá. “Ela [a Votoserv] não foi criada para a licitação”, enfatiza Dias, que também afirma que o cliente soube da licitação por meio do site da prefeitura, em junho. Porém, algumas horas antes, por telefone, o proprietário da Votoserv havia afirmado o contrário, dizendo ainda que teria começado as contratações de funcionários após vencer a licitação, em 13 de agosto.
Quanto à procuração dada a Milton Mendes – que estava como representante legal da Votoserv no dia do pregão presencial -, Welton Dantas comenta que o irmão do vice-prefeito de Votorantim está “dando uma força” para ele, mas que “ninguém ajudou em nada e não tem nada a ver o vice-prefeito”. O advogado Márcio Dias informa que Milton foi contratado por Dantas e nomeado como procurador por ter experiência em administrar negócios alimentícios. “Não há nenhum impedimento e o seu Milton não tem nada a ver com a administração pública”, defende Dias.
Resposta da prefeitura
A Prefeitura de Votorantim foi questionada, por meio da Secretaria da Comunicação, sobre quais as outras empresas que participaram do pregão, se a Votoserv possui licença de funcionamento e autorização da vigilância sanitária, se o fato de funcionar em um local alugado dentro de um outro restaurante seria legalmente aceito e se houve favorecimento de informações por conta da ligação com o irmão do vice-prefeito.
A resposta limitou-se a informar que “a empresa vencedora do pregão para o fornecimento de refeições aos servidores municipais cumpriu todos os itens exigidos pelo edital e, portanto, foi habilitada para prestar o serviço, tendo apresentado a documentação necessária. Todas as demais informações estão contidas no processo que é público e pode ser consultado pelos interessados. Não houve em nenhum momento favorecimento de informações a pessoas físicas ou jurídicas”.