26/11/2014 – Este ano, 90% dos contratos da Petrobras foram feitos sem licitação
Jornal Nacional
Decreto permite há 16 anos a dispensa de licitação. Mas há quem conteste a frequência com que isso tem sido feito nas condições atuais do mercado.
Este ano, 90% dos contratos da Petrobras foram feitos sem licitação. E não tem nenhuma ilegalidade, nisso. Existe um decreto há 16 anos que permite a dispensa de licitação. Mas há quem conteste a frequência com que isso tem sido feito nas condições atuais do mercado de petróleo.
Na lista de contratos da Petrobras uma palavra chama a atenção: dispensa. Um levantamento do Jornal Nacional revela que, em 2014, nove em cada dez contratos da empresa foram feitos sem licitação. Essa dispensa pode envolver grandes valores. Um contrato de 2010 e ainda em vigor, assinado diretamente com o consórcio Techint – Andrade Gutierrez, chega a quase R$ 2,5 bilhões.
Esses contratos estão dentro da lei. Um decreto do presidente Fernando Henrique Cardoso, de 1998, permite que a Petrobras siga um regime diferenciado nas contratações. Na época, foi uma saída para que a empresa tivesse mais agilidade nas tomadas de decisão e pudesse concorrer em igualdade de condições com empresas privadas.
“A lei é boa, o problema é que as pessoas usaram esse fim, esse benefício, para que participasse do mercado mais ativamente para fins contra a causa republicana, que é o desvio de verbas que você está acompanhando”, afirma Jerson Carneiro, professor de Direito do IBMEC.
A partir de 2008, com a descoberta do pré-sal, essa liberdade da Petrobras para celebrar contratos passou a ser cada vez mais questionada. O novo regime de exploração do petróleo determina que a estatal seja a operadora única em todos os blocos do pré-sal, limitando a competição com empresas estrangeiras.
“Essa situação, onde a legislação é para um mercado de concorrência, e o mercado na prática é um mercado monopolista, cria uma atmosfera propícia para esses eventos que estamos vendo, que estão sendo revelados pela Operação Lava Jato”, diz Adriano Pires, diretor do CBIE.
O Tribunal de Contas da União já multou a Petrobras e quer que a empresa volte a fazer licitações, de acordo com as regras seguidas por todos os outros órgãos públicos. Existem também ações no Supremo Tribunal Federal questionando o decreto de 98.
“Nos últimos quatro anos, talvez a Petrobras tenha contratado em compras e bens – isso exclui serviços e obras – aproximadamente R$ 60 bilhões. E desses R$ 60 bilhões mais da metade foi feito sem licitação”, defende Rafael Cavalcante, secretário para a Área de Energia do TCU.
“Sob o ponto de vista da regulação de licitações ela é o único ente público brasileiro que tem uma regulamentação especial”, afirma Cláudio Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil.
Para os especialistas que defendem o decreto, sem ele a Petrobras não teria agilidade para competir no mercado internacional de petróleo.
“Eu temo que se queira curar a febre colocando o termômetro na geladeira. Na medida em que os escândalos de corrupção que existem em licitações no Brasil, acometem tanto as licitações sujeitas à lei geral de licitações, a lei 8.666, quanto dentro da Petrobras licitações submetidas a esse decreto simplificado. Então é preciso encontrar um meio termo, encontrar uma solução de um regulamento de licitações que seja ágil o bastante para dotar a intervenção do Estado do domínio econômico de eficiência respeitando princípios básicos de impessoalidade, de moralidade e de transparência”, diz Gustavo Binenbojm, professor da Faculdade de Direito UERJ.
A Petrobras declarou que as contratações seguem estritamente o que a legislação determina.