28/11/2014 – Octapharma recebeu quase R$ 700 milhões do governo
Globo News
MP tenta impedir que o governo brasileiro assine contratos com o laboratório que tinha como consultor o ex-primeiro-ministro português, José Sócrates, preso na semana passada.
O Ministério Público Federal tenta impedir na Justiça que o governo brasileiro assine contratos com o laboratório que tinha como consultor o ex-primeiro-ministro português preso na semana passada.
José Sócrates é acusado de corrupção em Portugal e chegou a visitar o Brasil como representante da empresa farmacêutica.A justiça brasileira ainda não se manifestou sobre o pedido feito pelo Ministério Público em 2008. E de lá pra cá, o laboratório recebeu quase R$ 700 milhões do governo brasileiro.
Em 2008, o Ministério Público Federal acusou sete pessoas e três empresas de envolvimento no escândalo na Máfia dos Vampiros. De acordo com as investigações, os acusados combinavam preços e fraudavam licitações do Ministério da Saúde para comprar remédios para o tratamento de hemofílicos. O esquema resultou em valores bem acima do mercado. Entre as empresas acusadas de fraude, estava a Octapharma, farmacêutica com sede na Suíça.
Em 2013, a Octapharma contratou o ex-primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates, como consultor para a América Latina. Sócrates está preso desde a última sexta-feira, acusado em seu país de crimes de corrupção, fraude fiscal e lavagem de dinheiro, no período em que esteve no governo português de 2005 a 2011. Na ação civil pública, os procuradores pediram a anulação dos contratos firmados entre o Ministério da Saúde e a Octapharma, a devolução aos cofres públicos da verba supostamente desviada, e a proibição de negociações entre a empresa suíça e o governo brasileiro. Até hoje, não houve sentença sobre o caso.
Depois da ação do Ministério Público, o governo federal pagou, nos últimos cinco anos, mais de R$ 693 milhões a Octapharma. O levantamento no orçamento da União foi feito pela ONG Contas Abertas, especializada em transparência nos gastos públicos, a pedido da GloboNews.
Para o economista Gil Castelo Branco, da ONG, mesmo sem uma decisão da Justiça, impedindo a Octapharma de participar de licitações, os órgãos de controle do governo federal poderiam proibir novos contratos com a empresa no âmbito administrativo.
“É no mínimo estranho que uma empresa que está sendo processada por um envolvimento em licitações no Ministério da Saúde receba dessa mesma pasta uma importância tão significativa sem que se saiba ao certo se ela estava ou não envolvida na tal operação vampiro. Se há provas de que ela havia de fato participado de fraudes em licitações públicas, então os órgãos envolvidos, a começar pelo Ministério da Saúde, já deveriam tê-la colocado como inidônea para que ela não tivesse novos contratos inclusive com a própria pasta”, afirma Gil Castelo Branco, da Associação Contas Abertas.
De acordo com o levantamento feito pela Contas Abertas, 2012 foi o ano que a Octapharma mais faturou em contratos com o governo brasileiro. Foram R$ 235 milhões. Em 2013, recebeu R$ 118 milhões. Este ano, pagamentos feitos pelo Ministério da Saúde já superam os R$ 124 milhões. Em fevereiro de 2013, José Sócrates chegou a se encontrar como representante da Octapharma com o então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, em Brasília. O encontro estava na agenda pública do ministro.
Segundo a Procuradoria Geral da República de Portugal, o inquérito que investiga José Sócrates e que levou ao cumprimento do mandado de busca e apreensão, na sede da Octapharma, em Lisboa, está em segredo de justiça.
A Controladoria Geral da União informou que, na época do escândalo da Máfia dos Vampiros, não era responsável por abrir processos de inidoneidade contra empresas privadas. Disse ainda que investigava apenas servidores públicos suspeitos de corrupção.
A CGU afirmou que, de acordo com a Lei das Licitações, o principal responsável pela abertura de processos contra empresas suspeitas de fraude são os órgãos contratantes. Neste caso, o Ministério da Saúde.
Procurado pela GloboNews, o Ministério da Saúde informou que o processo continua na Justiça e que desconhece novos elementos sobre o caso.
Em nota divulgada à imprensa portuguesa, a Octapharma informou que demitiu José Sócrates do cargo de consultor para a América Latina.