25/12/2019 – Ex-ministro catarinense Vinicius Lummertz é citado em relatório sobre fraude no Ministério do Turismo
NSC Total
Lummertz foi ministro na gestão de Michel Temer. Nascido em Rio do Sul, também foi secretário do governo de SC e presidente da Embratur
Por Folhapress – Por Ranier Bragon
Investigação preliminar realizada pela corregedoria do Ministério do Turismo resultou em relatório que aponta suspeita de que o ex-ministro da pasta e hoje secretário do governo João Doria (PSDB), Vinicius Lummertz, tenha participado de ação fraudulenta no apagar das luzes da gestão Michel Temer (MDB).
O relato foi formalizado em despacho assinado em 21 de março deste ano pelo então corregedor da pasta, Nilton Carlos Jacintho Pereira, e obtido pela reportagem via Lei de Acesso à Informação.
De acordo com o documento, apurações preliminares da corregedoria confirmaram indícios de “graves condutas” praticadas pela pasta, que resultaram na anulação quase completa de pareceres que visavam a recuperar cerca de R$ 20 milhões para os cofres públicos.
Conforme o jornal Folha de S. Paulo revelou, em outubro do ano passado –três dias antes da eleição de Jair Bolsonaro–, o ministério baixou uma portaria criando uma comissão para reavaliar pareceres que reprovavam integral ou parcialmente sete convênios firmados pela pasta entre os anos de 2006 e 2010, no governo Lula (PT).
Nos dois meses seguintes, três servidores designados para a comissão produziram pareceres revisando praticamente todas as conclusões anteriores, reduzindo a determinação de ressarcimento aos cofres públicos de R$ 21,5 milhões (em valores não corrigidos) para apenas R$ 19 mil.
Dois dos convênios foram alvos da Operação Voucher, da Polícia Federal, que em 2011 prendeu 36 pessoas sob suspeita de desvios de recursos do ministério.
O relatório da corregedoria do ministério, obtido agora pela reportagem, diz que “os levantamentos realizados confirmam indícios de graves condutas relacionadas à elaboração de pareceres que possibilitariam a desconsideração de débitos que as entidades não obtiveram êxito em comprovar a regular aplicação” dos recursos.
“Nas últimas semanas da gestão encerrada em dezembro de 2018, restou evidenciada a ocorrência de manobras pelas entidades, contando com o apoio de agentes do Ministério do Turismo mediante a criação de uma comissão especial para aprovar alguns convênios”, afirma.
A corregedoria registra que o caso também é de conhecimento do Ministério Público, do TCU (Tribunal de Contas da União) e da CGU (Controladoria-Geral da União).
Ela acrescenta: “Sob o aspecto disciplinar, há indícios de que os atos tenham sido adotados com o conhecimento e a orientação do então ministro de Estado e da consultoria jurídica, conforme um dos supostos participantes [que não é identificado] confirmou em sua manifestação à CGU”.
Lummertz foi ministro do Turismo de abril de 2018 até o fim do mandato de Temer, em 31 de dezembro daquele ano. Em janeiro deste ano, assumiu a pasta de Turismo de São Paulo, a convite de Doria.
Tidos como possíveis adversários eleitorais em 2022, o governador de São Paulo e o presidente Jair Bolsonaro (que deixou o PSL para criar um novo partido, a Aliança pelo Brasil) abandonaram a relação amistosa das eleições e têm ampliado a troca de críticas nos últimos tempos.
A reportagem pediu também via LAI, tanto ao Ministério do Turismo quanto à CGU, a documentação relativa à investigação sobre a comissão especial. Ambos os órgãos disseram que esses documentos estão sob sigilo até a conclusão das apurações.
A portaria que criou a comissão foi assinada pelo então secretário nacional de Qualificação e Promoção do Turismo, Babington dos Santos, conhecido como Bob Santos. Ele continua até hoje com cargo de direção no ministério.
Poucos dias depois da expedição do despacho pela corregedoria, o atual ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, determinou a suspensão dos efeitos da portaria, assim como os resultados produzidos pela comissão especial, até a conclusão da apuração pela CGU.
Entre os principais problemas dos convênios apontados pelos pareceres do ministério, investigações da PF e auditoria da CGU estão superfaturamento, licitações fraudadas, ausência dos serviços prestados e gastos sem relação com os convênios, como notas fiscais de consumo em uma das churrascarias mais caras de Brasília, a Fogo de Chão.
OUTRO LADO
Em nota, Vinicius Lummertz disse que durante sua gestão o Ministério do Turismo foi procurado por representantes de instituições que se sentiram prejudicadas com pareceres de técnicos da pasta.
“Para encaminhar a questão, a Secretaria Nacional de Qualificação e Promoção do Turismo, cumprindo sua obrigação de garantir transparência e justiça, editou portaria instituindo comissão especial para que os fatos fossem apurados”, disse.
O ministério afirmou em nota que, conforme informado anteriormente, os efeitos da portaria foram suspensos por Álvaro Antônio e o caso foi enviado para investigação.
“A decisão foi tomada, em abril deste ano, com o objetivo de que o órgão averiguasse as informações e tomasse as devidas providências.”
As principais parcerias foram firmadas pelo ministério com a Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) e a FBHA (Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação).
As entidades negam irregularidades. A Abrasel, que é a responsável por 5 dos 7 convênios, disse em julho que o pedido de reavaliação se ampara no princípio constitucional do amplo direito de defesa.
A FBHA afirmou que a comissão apenas referendou parecer de aprovação de 2018 que aponta necessidade de o ministério ainda repassar R$ 2,3 milhões à entidade relativos ao convênio, que também foi alvo da sindicância da Operação Voucher.
Também em julho o ex-presidente Temer afirmou, em nota, que a própria leitura da reportagem é suficiente para demonstrar que ele não tinha conhecimento do assunto.
“A decisão de ‘perdoar’ o que fosse (nem sei se isso realmente ocorreu) deu-se em nível de segundo escalão do Ministério do Turismo”, disse.