17/08/2020 – PCC domina cargos e licitações da Saúde e da coleta de lixo em cidade de SP

Metrópoles
Estadão Conteúdo

Após doações a campanha de prefeito, pela 1.ª vez traficante da organização monta esquema igual ao das máfias italianas e mexicanas

Investigação da Polícia Civil de São Paulo identificou atividades de um ramo do Primeiro Comando da Capital (PCC), cujo nível de organização e penetração no poder público é semelhante ao das máfias italianas. Ela mostra que bandidos da facção não só dominaram o setor de saúde de uma cidade da Grande São Paulo, como também dominavam a coleta de lixo. E, assim, fraudavam licitações, empregavam seus protegidos no governo, ameaçavam concorrentes e até desviavam medicamentos comprados pelo município para misturar à cocaína vendida pelo grupo.

A Operação Soldi Sporchi (dinheiro sujo, em italiano), deflagrada pelo 4.º Distrito Policial de Guarulhos, desbaratou a organização criminosa que agia em Arujá, cidade com 90 mil habitantes na Grande São Paulo. De acordo com o delegado Fernando José Santiago, o esquema tinha a participação do vice-prefeito da cidade, Márcio José de Oliveira (Republicanos), que chegou a ser preso no dia 30, junto com outros sete acusados de envolvimento no esquema que nasceu como uma forma de lavar dinheiro do tráfico de drogas e agregou à organização criminosa os crimes surgidos pelo domínio da administração da cidade.

Para especialistas em crime organizado ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, o esquema é muito semelhante ao mantido por organizações mafiosas, a ‘Ndrangheta, a máfia de origem calabresa, hoje a mais poderosa da Europa. “Nunca havia visto nada parecido”, afirmou o promotor Lincoln Gakyia, que há mais de 15 anos investiga as atividades da cúpula do PCC. O grupo teria recebido R$ 77 milhões em contratos da Prefeitura. O acusado de liderar o grupo era Anderson Lacerda Pereira, o Gordo, um dos maiores do PCC.

Gordo está foragido. Ele manteria ligações com André Oliveira Macedo, o André do Rap, um dos maiores traficantes do PCC. Preso em 2019, André do Rap mantinha ligações com a ‘Ndrangheta para enviar droga para a Europa e com integrantes do cartel de Sinaloa, o mais importante do narcotráfico do México.

André do Rap e Gordo foram condenados pela Justiça pelo envio de toneladas de cocaína apreendidas no porto de Gioia Tauro, na Calábria, na Itália. De acordo com a polícia, Gordo é dono de um patrimônio que envolve sítios, casas, carros de luxo e embarcações. Além de políticos de Arujá, ele teria sido flagrado mantendo contatos com deputados de São Paulo. “Ele tinha o traficante colombiano Pablo Escobar como modelo. Tinha até um jacaré em uma de suas propriedades, um sítio”, afirmou o delegado.

Em Arujá, a ação do grupo começou em 2016, durante a campanha para prefeito, quando Gordo procurou o vice-prefeito da cidade, Márcio Oliveira. Gordo ofereceu a Oliveira dinheiro para a campanha do prefeito José Luiz Monteiro (MDB) em troca da promessa de, caso a chapa fosse eleita, o traficante teria o controle dos serviços de saúde e coleta de lixo da cidade. De acordo com o delegado, o bandido do PCC entregou ao candidato o dinheiro, mas o vice teria se apossado da quantia.

Após a eleição, Anderson passou a cobrar, inclusive por meio de ameaças, o cumprimento do trato. Segundo o inquérito, o vice Márcio Oliveira levou o prefeito José Luiz Monteiro a uma reunião na casa de Gordo, onde, segundo relatos colhidos pela polícia, “havia uma quantidade razoável de pessoas em postura intimidatória”. Neste encontro, ainda segundo a Polícia Civil, o prefeito teria tomado conhecimento do acordo feito por seu vice e, ao retornar à prefeitura, afirmou a auxiliares que, se o município não permitisse a entrada de pessoas jurídicas ligadas a Gordo nos contratos da saúde, “todos iriam morrer”.

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