Felipe Boselli
OAB/SC 29.308
Setembro de 2016
No pregão, seja ele eletrônico ou presencial, para que a licitante inconformada com o resultado do certame possa recorrer, ela deve manifestar que tem o interesse de contestar a decisão de julgamento do pregoeiro, informando os motivos pelos quais discorda do resultado proferido, de forma expressa. Essa regra está estabelecida no inciso XVIII do artigo 4° da Lei 10.520/2002:
XVIII – declarado o vencedor, qualquer licitante poderá manifestar imediata e motivadamente a intenção de recorrer, quando lhe será concedido o prazo de 3 (três) dias para apresentação das razões do recurso, ficando os demais licitantes desde logo intimados para apresentar contra-razões em igual número de dias, que começarão a correr do término do prazo do recorrente, sendo-lhes assegurada vista imediata dos autos;
Tal manifestação deve ser apresentada logo após a divulgação do vencedor do certame. O prazo para a manifestação da intenção de recorrer, mesmo sendo muito curto, não é um problema no caso dos pregões presenciais, visto que as licitantes estão presentes na sessão onde é divulgado tal resultado e, de imediato, fazem a comunicação, sendo que o pregoeiro deve perguntar se haverá intenção de recorrer e aguardar as manifestações ali, na hora.
Nos pregões eletrônicos, em que a sessão é contínua e curta, nos quais todas as licitantes em geral permanecem conectadas até o final do certame, um prazo reduzido prazo (mas razoável) para manifestar a intenção de recorrer também não é um grande problema.
A dificuldade de fazer a manifestação no prazo determinado ocorre no nos pregões eletrônicos, em que a sessão pode durar vários dias e, em determinado momento, desconhecido dos licitantes, pois nem sempre o pregoeiro comunica quando vai divulgar o resultado, é revelada a vencedora do certame e aberto o prazo para manifestação da intenção de recorrer, prazo esse que não foi estabelecido na legislação, variando de uns poucos minutos até alguns dias. No caso específico do Comprasnet, o pregoeiro escolhe um prazo ente 20 minutos e 72 horas.
No caso de prazos muito curtos (existem casos de apenas um minuto para que se registre a intenção de recorrer), se a licitante não esteja olhando para a tela do computador o tempo todo, ela pode não ver a informação nesse reduzido prazo e, portanto, não conseguir manifestar a intenção de recorrer, o que implica na perda do seu direito de defesa. E como se sabe, existem casos em que o certame dura meses, o que inviabiliza, por completo, o seu acompanhamento minuto a minuto.
O tribunal de Contas da União, já se manifestou, no sentido de que o razoável seria, no mínimo, 30 minutos (Acórdão Nº 1020/2010 – TCU – Plenário). Mas noutra direção o TRF 2ª Região (Processo: 201251010027282, Relatora: Juíza Federal Convocada Carmen Silvia Lima De Arruda) considerou razoável o prazo de 4 minutos e 25 segundos:
7. In casu, da leitura da ata da sessão pública, observa-se que o momento, em que o pregoeiro declarou a abertura do prazo para intenção de recurso foi em 24/02/2012 às 16:06:20, enquanto que a data de encerramento para a intenção de recorrer dos licitantes foi em 24/02/2012 às 16:10:45. Durante este lapso temporal, a impetrante-apelante, segundo a ata, não manifestou sua intenção de recorrer da decisão do pregoeiro que a inabilitou. Daí é que, a apelante, por preclusão temporal, decaiu do direito de interpor qualquer recurso administrativo atinente ao presente certame licitatório, nos termos dos arts. 4º, incisos XX, da Lei n.º 10.520/2002 c/c art. 26, § 1º do Decreto n.º 5.450/2002. Não há, pois, qualquer ilegalidade, nem na conduta do pregoeiro, e nem na tramitação do procedimento licitatório, havendo, em verdade, a decadência do direito de recorre por parte da impetrante-apelante.
8. Apelação conhecida e improvida. Sentença mantida, porém e nos termos do art. 515, § 3º do CPC, por outro motivo, qual seja o da improcedência dos pedidos nos termos do art. 269, inciso I, do CPC” (grifou-se)
Exemplo ainda mais restritivo é a situação considerada razoável pelo TRF 2ª Região (Apelação Cível 555982 2010.51.01.015446-5, Relator Desembargador Federal Guilherme Diefenthaeler) de abrir o prazo para a intenção de recorrer às 20h35min de uma sexta-feira e encerrá-lo às 08h10min da segunda-feira seguinte:
2. Afirma a Requerente falta de razoabilidade o referido prazo ter transcorrido entre às 20h35min de sexta-feira às 08h10min de segunda-feira, eis que decurso do mesmo ocorreu durante o fim de semana, fulminando a devida publicidade que todos os atos administrativos devem ter, cabendo salientar que na sexta-feira, naquele horário, o expediente da Apelada já havia se encerrado, e que sábado não pode ser considerado dia útil, já que o CNEN não funciona administrativamente neste dia.
[…]
5. Por fim, verifica-se que o prazo para registro de intenção de recurso deve começar em dia útil, o que restou devidamente comprovado, eis que, conforme afirmação do próprio Recorrente e documentação acostada aos autos, o início do referido prazo ocorreu em uma sexta-feira, dia 13/08/2010, dia útil de trabalho, não havendo qualquer ilicitude a ser questionada. (grifou-se)
Voltando ao posicionamento do TCU, é oportuno reproduzir parte do Acórdão 3.046/2008 – Plenário, Relator Ministro Ubiratan Aguiar, no qual é aplicada multa ao pregoeiro e à autoridade superior, pela restrição ao direito de defesa dos licitantes, no tocante ao prazo para manifestar a intenção de recurso:
7. No dia 4/1/2008, a Empresa […] foi declarada vencedora da etapa de lances. No dia 7/1/2008, o pregoeiro registrou que a referida empresa havia apresentado a documentação exigida e tinha sido considerada habilitada. Registrou, ainda, que o “Processo encontra-se com vistas franqueadas até as 18 horas de amanhã, dia 08/01/2008, para posterior abertura para intenções de recurso” (fl. 101).
8. Surpreendentemente, às 15:49:40 do dia 8/1/2008, o pregoeiro abriu prazo para intenção de recurso e, às 15:55:44, fechou o prazo para manifestação dessa intenção (fl. 106).
[…]
14. O procedimento utilizado pelo pregoeiro, portanto, foi inteiramente irregular e restringiu fortemente o direito de os licitantes recorrerem. […]
15. Dessa forma, fica demonstrado que as duas irregularidades caracterizadas neste Processo foram bastante graves e macularam seriamente o Processo. Seriam aptas, inclusive, a levar à anulação da licitação. […]
17. Dada a gravidade das irregularidades constatadas, acompanho a unidade técnica quanto à necessidade de aplicar multa ao pregoeiro, Sr. […], e ao Chefe Interino da DSG, […], autoridade que homologou a licitação. (grifou-se)
Seria muito interessante que o prazo (pelo menos o mínimo) para manifestação do recurso estivesse estabelecido na legislação para evitar abusos que, na prática, fulminam o direito de defesa da licitante.
Enquanto a questão não é tratada com o devido cuidado e respeito aos direitos das licitantes, as concorrentes devem tomar as medidas necessárias para assegurar que estão preparadas para registrar a intenção de recorrer no prazo que for determinado pelo pregoeiro. E boa sorte!