Empresa de agrotóxico é contratada para fazer inspeção veicular em MS
Folha de S. Paulo
Reynaldo Turollo Jr.
Para outras interessadas na licitação da Prefeitura de Campo Grande, houve direcionamento
Ex-prefeito assinou concessão no fim de seu mandato; nova gestão suspendeu contrato e vai revisar a licitação
Criada para fabricar agrotóxicos, uma empresa de Campo Grande mudou seu objeto social, ampliou seu capital de R$ 100 mil para R$ 12,5 milhões um mês antes da licitação e levou o contrato da inspeção veicular na capital de Mato Grosso do Sul.
O consórcio vencedor foi o único a atender às exigências da prefeitura, e ofereceu o valor mínimo de outorga (pagamento à prefeitura) previsto no edital: R$ 10 milhões. O contrato supera meio bilhão.
Na avaliação das outras empresas interessadas no contrato, houve direcionamento, como por meio da exigência de certificações específicas.
O novo prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal (PP), decidiu nesta semana suspender o contrato com o consórcio Inspecionar, até que sua equipe reveja a licitação.
A Ivex Inspeção Veicular (antes Agro Química Genérica Ltda.) pertence ao médico anestesista Francisco Ilgenfritz, conhecido do ex-prefeito Nelson Trad Filho (PMDB), que também é médico.
O contrato, de R$ 503 milhões em 20 anos, prorrogáveis por mais 20, foi assinado por Trad Filho a dez dias do fim de seu mandato.
No endereço de registro da Ivex, nada funcionava até a última segunda, quando um pintor começou a arrumar o imóvel de três cômodos.
O irmão do dono da Ivex, o cirurgião plástico João Ilgenfritz, que fundou com a mulher a empresa de agrotóxicos em 2003, confirmou à Folha que a firma não desenvolveu nenhuma atividade de inspeção.
Também compõem o consórcio as empresas Cotran, que faz inspeções de segurança no RJ, e Otimiza, que desenvolve softwares em MG.
A Cotran foi a responsável por comprovar que o consórcio já tinha experiência em inspeção, embora faça no Rio inspeções de segurança, e não propriamente ambientais. Ela tem 5% de participação no consórcio, e a Ivex, 65%.
Na cidade, a inspeção será anual, obrigatória e custará R$ 67. Se o carro for reprovado, o motorista terá 20 dias para repará-lo e retornar, pagando mais 50% da taxa. A frota é de 450 mil veículos.
Para efeito de comparação, a tarifa em São Paulo é de R$ 47,44, e neste ano será bancada pela gestão Fernando Haddad (PT). Não há taxa de reinspeção em caso de reprovação se o retorno ocorrer em 30 dias. A frota é de 6,8 milhões.
Para o presidente da OAB em MS, Júlio Cesar Rodrigues, há “vícios” que podem levar ao cancelamento do contrato.