O SIGILO DAS PROPOSTAS
Felipe Boselli
OAB/SC 29.308
Março de 2017
A publicidade é um princípio básico do procedimento licitatório, previsto, junto com a própria definição de licitação, no artigo 3° da Lei 8.666/1993. O legislador reitera esse conceito no art. 63 da Lei 8.666/1993, ao garantir o acesso de qualquer interessado ao processo:
Art. 63. É permitido a qualquer licitante o conhecimento dos termos do contrato e do respectivo processo licitatório e, a qualquer interessado, a obtenção de cópia autenticada, mediante o pagamento dos emolumentos devidos.
O acesso às informações do processo licitatório e dos contratos administrativos está também regulamentado pela Lei de Acesso a Informação, Lei 12.527/2011, que no seu artigo 7°, expressamente prevê o caso de licitação e contrato administrativo:
Art. 7° O acesso à informação de que trata esta Lei compreende, entre outros, os direitos de obter:
[…]
VI – informação pertinente à administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos; e
Na mesma linha de assegurar a ampla publicidade, a Lei de Acesso a Informação ordena que a Administração deve divulgar os editais e os contratos em local de fácil acesso. Assim ordena o artigo 8°:
Art. 8° É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.
[…]
IV – informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados;
Em que pese a insistência do legislador em reforçar o princípio da publicidade, esta não é absoluta, pois a proposta do licitante, até a sua regular abertura, é considerada sigilosa, como ordena o § 3° de art. 3° da Lei 8.666/1993:
§ 3° A licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.
Devassar o sigilo da proposta é crime, tal qual rege o art. 94 da Lei 8.666/1993, com pena prevista de detenção de dois a três anos, e multa.
Importante destacar que o sigilo da proposta sé existe até a data de sua regular abertura. Após a abertura do envelope da proposta, na sessão própria para tal, o seu conteúdo passa a receber, como todo o restante do processo, o tratamento de ampla publicidade, devendo ser divulgado a qualquer interessado.
A quebra do sigilo da proposta pode ocorrer de forma intencional com a participação de concorrentes agindo em conluio, com ou sem o conhecimento da Administração, ou também pode ser devassado o sigilo das propostas por algum agente da Administração, para favorecer um determinado licitante. Em qualquer caso, devem ser adotas as medidas cabíveis para coibir essas práticas ilegais.
Mas a quebra do sigilo da proposta também pode ocorrer de forma acidental, quando, por exemplo, o envelope de proposta de uma licitação é aberto na sessão de outro certame, ou mesmo quando uma proposta é aberta ainda na fase de habilitação, nos casos em que a habilitação precede a classificação das propostas.
Mesmo nos casos em que a violação da proposta não for intencional, está configura a quebra do sigilo da proposta e o certame fica comprometido.
Outro ponto a ser considerado quanto ao sigilo das proposta é a participação, na mesma licitação, de empresas com sócios em comum. Nesse sentido é interessante o posicionamento do TCU, no Acórdão n° 3.108/2016 – Primeira Câmara:
7. Com efeito, segundo a jurisprudência desta Corte de Contas, em licitações sob a modalidade convite, é irregular a participação de empresas com sócios em comum, pois tal situação afasta o caráter competitivo do certame e configura fraude à licitação. Nesse sentido, os Acórdãos 526/2013-TCU-Plenário, 1.047/2012-TCU-Plenário, 2.003/2011-TCU-Plenário, dentre outros.
8. Importante salientar que a participação simultânea de empresas com sócios comuns em licitação não caracteriza, por si só, a ocorrência de fraude, mas somente merece ser considerada irregular quando puder alijar do certame outros potenciais participantes. É o que acontece quando se verifica tal coincidência nas licitações sob a modalidade convite, em que os participantes são convidados pela Administração e a publicidade do certame é naturalmente mais restrita, de sorte que a participação de empresas com sócios em comum afasta qualquer possibilidade de competitividade efetiva entre os licitantes, além de comprometer o sigilo das propostas, dificultando a busca pela proposta mais vantajosa para a Administração.
Não é apenas a participação de empresas com sócios em comum que caracteriza a quebra de sigilo das propostas, é necessário que se existam outros elementos que possam corroborar a tese da quebra do sigilo das propostas.
Dada a relevância do sigilo da proposta até a sua abertura, exceção ao princípio da publicidade, devem estar atentos, tanto pregoeiros e comissões de licitações, quanto licitantes, para não adotar alguma conduta que possa colocar em risco o sigilo da proposta.