ENTREGA PARCELADA x ENTREGA DE PARCELA
Felipe Boselli
OAB/SC 29.308
Janeiro de 2017
Por vários motivos a Administração pode ter interesse em comprar uma quantidade de um determinado objeto, mas não quer receber tudo de uma vez só, nessas situações é feita uma compra com entrega parcelada, cuja formatação mais adequada, na maioria dos casos, é o sistema de registro de preços.
Na compra com entrega parcelada é feita a licitação para uma grande quantidade, aproveitando a economia de escala, mas o recebimento do material é feito aos poucos, assim como o pagamento, otimizando o fluxo de caixa e reduzindo custos com estoque do produto e até com perda de material.
A compra com entrega parcelada ajusta-se perfeitamente à legislação vigente estando, inclusive, prevista no inciso III do artigo 6° da Lei 8.666/1993:
Art. 6° Para os fins desta Lei, considera-se:
[…]
III – Compra – toda aquisição remunerada de bens para fornecimento de uma só vez ou parceladamente;
A contratação com entrega parcelada também está prevista no inciso II do artigo 3° do Decreto 7.892/2013, que regulamenta o sistema de registro de preços, como uma das hipóteses da utilização desse sistema:
Art. 3º O Sistema de Registro de Preços poderá ser adotado nas seguintes hipóteses:
[…]
II – quando for conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços remunerados por unidade de medida ou em regime de tarefa;
Na compra com entrega parcelada a Administração licita, por exemplo, 2.000 kg de arroz e vai fazendo pedidos, parcelados, conforme a necessidade, tudo como previsto na legislação e na ata de registro de preços, se for o caso.
Não se pode, no entanto, confundir “entrega parcela” com “entrega de parcela” do objeto, situação completamente diferente.
A utilização da entrega de apenas uma parcela do objeto deve ser feita com muita cautela e com as devidas justificativas, possivelmente implicando até em alteração contratual.
Na entrega de parcela do objeto a contratação foi feita para um objeto uno ou um lote (conjunto) de itens, para o qual a contratada ofereceu a melhor proposta pelo todo, e a entrega é feita só de uma parte desse objeto de só de alguns itens do lote, o que pode, em tese, descaracterizar a melhor proposta.
A entrega parcela do objeto a contratação é feita, por exemplo, para aquisição de um lote de informática formado por: notebooks, monitores, teclados, mouses e softwares, mas, por algum motivo, a entrega é feita a aquisição apenas de monitores. Não há como garantir que essa compra continue sendo vantajosa para a Administração.
Neste exemplo foi alterado o sistema de licitação, que era por lote, para contratar um único item dentro de um pacote.
O fato de uma empresa ter ofertado um preço vantajoso para o lote não significa que cada um dos itens do lote também tenha o preço mais interessante para a Administração.
É perfeitamente possível que tenha ocorrido a chamada “jogada de planilha” com o desconto sendo aplicado de forma diferenciada entre cada um dos itens e aquisição de um único item do lote pode exterminar o desconto obtido no processo licitatório.
O Tribunal de Contas da União, assim tratou da diferença entre “entrega parcelada” e “entrega de parcela”, no Acórdão 125/2016 – Plenário:
3. utilização do Sistema de Registro de Preços é possível, nos termos do art. 3º, inciso II, do Decreto 7.892/2013, quando for conveniente a aquisição de bens com previsão de entregas parceladas. Não há que se confundir, todavia, entrega parcelada com entrega de parcelas do produto. A primeira ocorre quando são demandadas várias aquisições do objeto licitado na configuração em que prevista pelo órgão responsável pelo Sistema de Registro de Preços. A segunda, que não é albergada pela legislação retro mencionada, cuida de aquisições em que são demandadas partes do objeto licitado em quantitativos diferentes daqueles inicialmente previstos. 4. A impossibilidade de aquisição separada de itens de objeto adjudicado por preço global em contratações realizadas por meio de Sistema de Registro de Preços foi ratificada pelo TCU mediante o subitem 9.3.2 do Acórdão 757/2015 – Plenário.
Para melhor ilustrar a diferença entre “entrega parcelada” e “entrega de parcela”, suponha a necessidade de compra de alguns móveis que compõem uma estação de trabalho (mesa, cadeira, gavetas etc), que foram agrupados em um lote. Se há previsão de aquisição de vários lotes dessa estação de trabalho, conforme for havendo a demanda, poderá ser feita uma “compra parcelada”, ou seja, só da quantidade de lotes necessária naquele momento, sendo, com já dito, o sistema de registro de preços a forma mais adequada para tal contratação.
No entanto, caso seja adquirido apenas um dos móveis que faz parte do lote (somente a cadeira, por exemplo), essa será uma “compra de parcela” do objeto, o que requer muito cuidado, pois estaria descaracterizado o objeto e com chances de cair numa compra prejudicial para a Administração.